Murilo Saraiva Queiroz
O Segredo da Moça
A voz de Seu Joaquim baixou ainda mais, nos forçando a nos inclinar para frente.
"Era 1908. Maria Eulália era filha de uma das famílias mais respeitadas da cidade. Moça bonita com olhos da cor do rio ao amanhecer. Ela foi prometida ao filho de outra família rica, uma fusão de terras e gado mais do que um casamento."
Seus dedos nodosos traçavam padrões na areia enquanto falava.
"Mas Maria tinha um segredo. Ela escapava para o rio ao entardecer, alegando rezar no pequeno santuário de Nossa Senhora perto da beira da água. O santuário havia sido colocado lá pelo Padre Heinrich, um dos missionários alemães que permaneceu depois que a igreja foi construída."
Seu Joaquim fez uma pausa para tomar um gole de cachaça de uma caneca de metal desgastada.
"Ela não estava rezando. Estava se encontrando com alguém-um jovem que não era seu prometido. Alguns dizem que ele era um simples pescador; outros sussurram que era um dos padres. Qualquer que seja a verdade, quando chegou o inverno, ela não podia mais esconder sua condição."
Os olhos do velho se nublaram com algo entre tristeza e medo.
"Sua família a expulsou. Naqueles dias, tal vergonha poderia destruir linhagens inteiras. Ela viveu em uma pequena cabana à beira do rio, sozinha exceto pela caridade ocasional de mulheres que desafiavam seus maridos para levar-lhe comida. Quando chegou sua hora, ela deu à luz sozinha, na noite mais fria de julho."
A fogueira crepitava, enviando faíscas para o céu noturno.
"O que aconteceu em seguida depende de quem conta a história. Alguns dizem que a loucura a tomou; outros acreditam que foi o desespero. Ela entrou no rio com seu recém-nascido, sussurrando orações ou maldições-ninguém sabe. Ela deixou a criança cair na parte mais profunda do canal e então tirou sua própria vida."
Eu tremi apesar do ar quente da noite.
"Mas o rio não simplesmente leva, garoto," disse Seu Joaquim, de repente se dirigindo diretamente a mim. "Às vezes ele transforma."