SEVERIANO RENDEIRO E OS VAPORES – Final
Viana ganhou muito respeito com seu trabalho, sua postura séria e luta incessante em busca de maiores conhecimentos. Para se ter uma ideia ele formou-se em contabilidade aos 56 anos, um feito e tanto, a considerar que, para isto, teve de se deslocar para Montes Claros. Daí ter sido sempre procurado para compor diretorias de entidades, alternando os cargos de tesoureiro e presidente.
Quando foi fundada a Colônia dos Pescadores de São Francisco, institui-se uma janela junta governativa, tendo como presidente Zezé Generoso e Viana como tesoureiro. Na primeira eleição da entidade, Viana elegeu-se presidente, cargo que exerceu por muitos anos – ainda hoje ele é ligado à Colônia. Antes, foi pescador de carteirinha (amador). Foi também tesoureiro da Legião de Maria, da Conferência São Vicente de Paulo, do Automóvel Clube, do Dínamo Esporte Clube e do partido político Movimento Democrático Brasileiro (MDB).
Viana nasceu em 1919, filho de Francisco Gomes Rendeiro e Maria Ana da Conceição. Casou-se pela primeira vez com Celina Soares Rendeiro (falecida), baiana como ele. Seu padrinho de casamento foi Arsênio Lopes, pai de Raulino Lopes Neves, de quem Viana foi colega de escola, em Sítio do Mato, onde também fez amizade com José Lopes e Massu. Casou-se pela segunda vez com Terezinha Vieira de Brito Rendeiro, com quem vive até hoje, numa confortável casa que construiu na rua até hoje, numa confortável casa que construiu à rua Cassiano José Vieira, com muitos coqueiros, para lembrar a velha terra.
O interessante, na conversa com Viana, é a maneira saudosa como ele fala dos vapores. É interessante lembrar que, assim como o rio São Francisco, os vapores estão intimamente ligados a muitos capítulos de nossa história – a vida de São Francisco nasceu pelo rio, com a subida dos bandeirantes e, depois, com os chegantes, oriundos da Bahia, Pernambuco, Piaui, Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, todos contando, com indelével saudade, a viagem pelo vapor que os trouxe pela vez primeira à terra.
Assim, Viana vai trazendo à vida os velhos vapores. Da Viação Baiana do São Francisco: Mata Machado, Cordeiro de Miranda, Djalma Dutra, Saldanha Marinho, Barão de Cotegipe, Fernando da Cunha, Juracy Magalhães e Antônio Muniz – a sede da companhia era em Juazeiro. Da Viação Mineira do São Francisco: Engenheiro Halfed, Raul Soares, Fernão Dias, Wanceslau Braz, Antônio Nascimento, Governador Valadares, Curvelo, e Paracatuzinho – a sede era em Pirapora. Da companhia e Indústria de Pirapora: São Francisco, Benjamim Guimarães e Otávio Carneiro. Havia ainda o Salvador, que era de propriedade do coronel Clemente de Araújo Castro, da Bahia. O Coronel Clemente era um homem muito rico, que gostava de andar sempre muito bem vestido, e cismava que o comandante do seu vapor tinha de ser um seu compadre, o que o levava a constantes atritos com a Capitania. Existiam vapores com três classes: a primeira, com camarotes, e a segunda, sem acomodações, onde os passageiros geralmente armavam redes. O Saldanha Marinho tinha duas pás, nas laterais; os apitos mais apaixonados e que chamavam mais atenção eram do Barão de Cotegipe (duetado), do Halfed e do Antônio Nascimento – quando apitavam, de longe o barranqueiro os reconhecia e se encaminhava para o porto para recebê-lo.
Além de passageiros, os vapores carregavam muita carga nos porões e alguns ainda rebocavam lanchas. Às vezes, o vapor ficava atracado um dia inteiro no porto, descarregando e carregando carga; outras vezes parava apenas para entregar o correio. Viana lembra que, de quando em quando, o Sr. Oscar Caetano conseguia a liberação de um deles para fazer carregamento exclusivo para a Aliança Comercial Ribeirinha, de São Francisco para Pirapora, transportando mamona – era um dia inteiro de intensa movimentação de carroças levando sacaria para os cais.
Viana tem muitas histórias pitorescas sobre as viagens pelo São Francisco, lembrando, em algumas delas, o destino de passageiros clandestinos que, quando flagrados, às vezes pulavam no rio, dando um trabalho imenso à tripulação para salvá-los.
Severiano Viana Rendeiro, um grande exemplo de vida, mais um baiano que fez história em São Francisco.
Uma correção: o personagem da história da manilha, lembrado no capítulo anterior, não era Roberto e sim o pernambucano Zé Ferreiro.
João Naves de Melo