RAULINO LOPES NEVES
São Francisco é um município peculiar na sua etnia. O grande rio foi, sem dúvida, o maior responsável pelo surgimento de muitas famílias do município desde o início da civilização local, com a vinda dos bandeirantes. Depois, com a navegação do rio, vieram as levas de migrantes – uns por acaso, com dr. Ferreira e João Próbio, outros com destinação certa, como Raulino Lopes Neves. Nascido na Bahia, no Sítio do Mato, em 19 de abril de 1926, ele veio para São Francisco em 1948, abordo do famoso vapor Benjamim Guimarães, trazido por Maximino Magalhães, Massu, agente da Capitania dos Portos na cidade por muitos anos, com quem trabalhou quatro anos. Logo começou vida própria, montando seu comércio, na rua Euclides Mendonça, onde hoje é sua residência.
Estabelecido, em pouco tempo Raulino se integrou à sociedade são-franciscana, participando dos eventos sociais e da política. Era filiado à UDN, da qual foi tesoureiro e vereador. Na vida social frequentava, como todos os rapazes e casais da época, a Associação dos Amigos de São Francisco, que em nossos dias não tem nada paralelo, nem de perto. Ali participava das festas animadas pela música de Sebastião de Adelaide (pistons), Tutu (trombone) e Dudu (bateria), com performances eventuais de Faustino no clarinete. No Carnaval, a trupe local era reforçada por músicos de São Romão, os famosos Bispos. Sócio da AASF, veio também a ser sócio-proprietário do cinema construído na década de 60 – o Cine Canoas, hoje um trambolho abandonado enfeando a praça Centenário, sem nenhuma utilidade.
No início dos anos 50, Raulino conheceu Lígia Mendes, numa festa na casa de Dr. João Pitanguy, prócere da UDN e diretor do Campo de Sementes, hoje Caio Martins – e como eram famosas as festas no Campo de Sementes e depois na Caio Martins! Era como se desse um passeio ao campo, hoje praticamente no centro da cidade. Em 20 de setembro de 1952, Lídia se transformou na Srª. Lídia Mendes Neves e desta abençoada união nasceram os filhos Ana Maria, Maria de Fátima, Arsênio, Maria da Conceição (Tuca), Raulino Jr., Maria do Socorro, Ney, Neison e Arlete.
Mais tarde, Raulino transferiu o comércio para o tradicional ponto da Avenida Presidente Juscelino, na esquina com a avenida Dom Pedro de Alcântara, onde fazia contato permanente com os ruralistas da região sul e os do outro lado do rio, por ser um ponto estrategicamente localizado, na saída da cidade.
Em casa, dona Lígia, além de cuidar da numerosa prole – educando-os e preparando-o para a vida -, exercia uma atividade que a tornou famosa na cidade: a arte culinária.
Confeitarias para casamentos, com bolos belíssimos e saborosos; jantares encomendados; assados especiais; todo tipo de iguaria – arte que ainda hoje ocupa o seu tempo, muitas vezes com a participação das filhas que vão visitá-la.
Quando fui à casa de Raulino para entrevistá-lo, em companhia do meu caro garimpeiro de novidades, Dr. Elmiro Júnior, encontramos dona Lídia com o braço na tipóia, preparando iguarias encomendadas; e, com todo esmero e fina na arte, a ajuda de Anete. Todos aprendem e fazem bem, como se sabe pelos reflexos além, lá na Box 43, do Helvecinho, no Mercado, onde se vende o melhor frango assado da cidade – uma festa nas manhãs domingueiras.
O sucesso, no entanto, é a farofa de Ana Maria, disputada principalmente pelas crianças – que o diga minha netinha Júlia, a primeira que come.
A arte, o ofício, o exemplo, o caráter, tudo de bom que um casal bem constituído reflete na criação. Hoje, Raulino e dona Lígia estão sossegados, não precisam lutar tanto – embora não consigam ficar parados. Contudo, não é a sua condição social estável e confortável o seu maior patrimônio: são os filhos que legaram a São Francisco.
A cepa baiana mesclada com o tronco mineiro deu a São Francisco uma grande família.
João Naves de Melo
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