sexta-feira, 27 de abril de 2018

VOZES DOS CIDADÃOS



JOSÉ ALVES ALMEIDA

Abril 2001
A região de Mocambo, Vargem de Casa e Lagoa do Pintado, tem muito da história dos Almeida. A raiz do tronco que registramos foi Plácido Alves de Oliveira e Joana Francisca de Almeida, na fazenda Vargem de Casa, onde nasceu, em 23 de novembro de 1925, José Alves de Almeida, o Zeca de Plácido.
Tempos atrás, chegou a esta região o casal Manoel Alves de Oliveira e Maria Francisca das Neves. Veio do Gorutuba, como muitos outros, em levas de retirantes de uma grande seca que assolou aquela região, levando todos moradores à desesperadora fome.  Vieram em busca de água, nas proximidades do grande rio, o São Francisco, Não se assentaram nas barrancas, como observa o pesquisador são-franciscano, João Botelho Neto, em razão da sezão – foram se distribuindo pela região adjacente: Tinguis, Brejo dos Angicos, Buriti de Meio, Mocambo e depois foram se espalhando, à medida que constituíam novas famílias. Foi o caso de Plácido que deixou a grande fazenda do pai, no Mocambo, indo se instalar na Vargem Grande. Ali nasceu José Alves de Almeida que, ainda menino, fazia o caminho para São Francisco, na frente de um carro-de-bois, como guia. A viagem levava um dia e meio: saiam da fazenda Vargem de Casa numa madrugada e só chegavam ao mercado, em São Francisco, ao meio dia, do outro dia. Ali descarregavam suas mercadorias: mamona, algodão, rapadura ou milho, conforme a ocasião. Antes disso ele já conhecera São Francisco viajando com o pai, na garupa de cavalo. E lembra dessa época e anos mais adiantados: “São Francisco era uma corrutela. A cidade ficava no trecho entre a casa do Brazinho (avenida Montes Claros), passando pelo barranco do rio, subia no comércio de Cavalo Velho (rua Silva Jardim) e acabava na manga onde hoje é a praça de esportes (avenida Brasiliano Braz). Eram um punhado de casinhas, falhadas”.
Crescendo veio a conhecer o Cel. Oscar Caetano que foi prefeito da cidade no tempo da ditadura de Getúlio. Outro nome falado era o do Brazinho. Não fez mais contatos com os antigos, lembrando muito do “dr. Geraldo Ribas, um homem muito inteligente”. Dessa época também recorda do reboliço que causava o caminhão de Cândido, de Brasília de Minas, o primeiro que viu. “Ele levava uma semana para ir a Montes Claros e outra para voltar. O Cândido tinha que levar uns homens com foice, machado e enxadão para ir abrindo estrada. Tinha também a perua de Abner e o calhambeque do dr. Ferreira, um Fordinho. O pesado do transporte era feito nos vapores e barcaças, pelo rio ou pelas tropas de mulas. Era bonito ver a mula madrinha toda enfeitada, levando mais de cinco guizos, fazendo barulho na frente da tropa”.
Zeca de Plácido foi dos poucos são-franciscanos que estiveram às portas da Segunda Guerra Mundial. Convocado, ele partiu cheio de angústia, no vapor Curvelo, para Pirapora e de lá para Montes Claros, onde se submeteu aos exames médicos. Com ele foram Sady Maynart, Dário da Mata, Aldair e Nezinho Vieira, mas só ele e os dois últimos seguiram para Belo Horizonte, indo se alojar no 10º Regimento de Infantaria – Sady e Dário se livraram do risco do combate. Zeca, então, começou o treinamento puxado para o combate. A rendição da Alemanha o salvou. Bendita paz! Contudo, ele não pôde voltar logo para casa – ficou uns tempos mais no exército, pois havia um certo receio do recrudescimento da guerra, até mesmo em relação a atitudes belicosas da Argentina, à época a maior potência da América Latina e simpatizante do nazismo. Por fim, em 1946 ele foi incorporado como reservista de primeira classe e deu baixa, antes tendo feito um curso de cabo, não sendo aproveitado em razão do término da guerra.
Voltou para São Francisco. Não foi recebido com festas, nem teve homenagens. De volta à fazenda Vargem de Casa casou-se com Ana Vieira de Almeida e foi morar em sua própria fazenda, na Lagoa do Pintado.
Aquela região, diz ele, “era de muita riqueza. Terra muito boa, cheia de pântanos, brotando água e córregos fortes, escorrendo água o ano todo. Produzia-se de tudo: mamona, feijão, milho, algodão e principalmente cana-de-açúcar. Na época da construção de Brasília cansei de trazer o carro-de-bois cheio de rapaduras para mandar para lá, enchendo os caminhões aqui na cidade”.
Completou com tristeza: “hoje está muito diferente. Não se vê mais água correndo nos córregos e, neste ano, os pântanos estão secos de rachar o barro. Água só de poço”.
Do casamento com dona Ana, vieram os filhos José Carlos Almeida – cirurgião dentista e prefeito municipal de São Francisco, e José Aroldo Almeida.  José Carlos é casado com a cirurgiã-dentista Antonieta Yamamoto tendo o casal as filhas Luciana e Lana Key. Aroldo, empresário,é casado com  a contadora Vanusa, tendo o casal as filhas Mariana, Maria Elisa e Iara.

CAIO MARTINS, RETRATO DE UM BRASIL DE HOJE

XXXVII – Parte
OS EDUCADORES – FINAL

Fecho nossas lembranças sobre os educadores da Escola Caio Martins de Esmeraldas, na primeira fase, ou seja, no período em que lá estudei (1953/1956), pessoas simples, como disse, mas grandes educadores por natureza. Era nessa amálgama de educadores com as famílias da região, todas integradas ao sistema educacional através de atividades religiosas e culturais, que acontecia a Síntese Social pregada por Manoel Almeida.
Agora, faço o registro de duas personalidades ímpares: MARIA CÉLIA DOS SANTOS e MANOEL ALMEIDA, dois grandes educadores, humanistas e de uma visão além do seus tempo.
Começo focalizando Manoel Almeida o idealizador e fundador das Escolas Caio Martins (Esmeraldas, Pirapora/Buritizeiro, Urucuia, Carinhanha, São Francisco e Januária)
Cel Manoel Almeida,Coronel simplesmente como o chamávamos, passava todos fins de semana na escola, com sua família. Seu programa era muito rico. Nos sábados, geralmente, ele se fazia cercar por nós, ora no bosque, ora na Casa dos Escoteiros ou na Rádio (edifício que se transformou em sala de sessões de cinema, teatro e reuniões sociais), quando nos passava lições de vida, temperando nosso caráter. Então, de pequeno, através de suas preleções, fomos mergulhando no mundo dos filósofos e educadores – Sócrates, Platão, Aristóteles, Pestalozzi, Rousseau e Dewey. E de quando em quando estávamos de frente de Helena Antipoff, Amaral Fontoura, Malba Tahan e Anísio Teixeira, ouvindo suas falas. Muitas vezes sem nada entender, de imediato. Com o tempo passado, quando brotavam de nossos espíritos, de acordo com as ocasiões, entendemos que suas mensagens nos foram, pacientemente, implantadas.  O Coronel tinha uma maneira muito peculiar de se comunicar conosco. Falava por horas a fio, prendendo nossa atenção o tempo todo, porque ele passava as mensagens contando histórias, era um mestre das parábolas. Durante quatro anos a primeira turma do Curso Normal tinha encontros semanais com ele, Sutilmente ele começou a preparação da Bandeira do Urucuia. Falava sobre uma região ressaltando seus aspectos paradisíacos, com veredas tropicais, e atiçando nosso elã de mocidade com a existência, lá, de morenas dos olhos verdes. Tanto fala sobre do Urucuia, região que sequer havíamos, antes, ouvido falar, que a partir do terceiro ano do curso só pensávamos no grande momento da partida. Urucuia entrou em nossa alma e o nosso espírito ficou impregnado do Urucuia. Que pedagogo era o Coronel. Ele nos preparou para a grande missão, passo a passo, e assim, já no final do curso, dos 15 formandos – à exceção das mulheres -, ele recebera a adesão de 12 – não fizeram parte da Bandeira o Geraldo Almeida, que já era professor rural na região, Adilson, o caçula da turma, que tinha outras pretensões em Esmeraldas, onde vivia sua família de reconhecida proeminência – Campolina, e Durval, que tinha sonho de ser médico – o que conseguiu. O nosso compromisso com o Urucuia – que dizíamos ser a força do ideal ou ideal em marcha – era tanto que no dia da nossa formatura um fato muito especial me envolvendo, aconteceu. Eu fui o orador da turma. Foi um discurso emocionante, que narrava a saga caiomartiniana e nosso compromisso com a bandeira do Urucuia. Ele foi escrito, de forma magistral, o que lhe era peculiar, por dona Maria Célia, eu fui o intérprete e o fiz com tanto emoção, chegando às lágrimas, no que fui acompanhado pelos bandeirantes à medida que eu os conclamava a responder o chamado, por muitos dos presentes à cerimônia e, pasme-se, pelo paraninfo da turma, governador Bias Fortes. Encerrada a sessão fui procurado por um senador – Francisco Naves. Disse ele que eu era parente dele e que gostaria custear um curso superior para mim – o que escolhesse. Agradeci de coração, mas declinei da oferta dizendo que eu tinha um compromisso com o Urucuia. Ele, então, retrucou dizendo que quando eu tivesse cumprido minha missão, o compromisso dele estaria de pé.  Três anos depois, cheio de pesar, eu deixei o Urucuia para dirigir a Escola Caio Martins de São Francisco. Deixei o Urucuia, de corpo, mas o Urucuia nunca deixou minha alma.
O Coronel soube tão bem semear.
Na história das Escolas Caio Martins – todos os núcleos plantados pelo idealismo de Manoel Almeida, por sua visão, deslumbrando o futuro novo para regiões abandonadas, desassistidas, o seu nome sempre será reverenciado. Depois, no campo da educação e da assistência social, o seu olhar e atenção muito especial voltados para a criança e para o homem do campo, provando grandes transformações, ele deve ser lembrando pelo serviço prestado à nação brasileira. Um exemplo que deveria ser seguido por nossos governantes e políticos, que infelizmente não falam com a linguagem do coração, do idealismo.
João Naves de Melo

70 ANOS DA FUCAM


Neste ano comemora-se os 70 da fundação das Escolas Caio Martins, instituição fundada por Manoel Almeida no mês de janeiro de 1948, no antigo campo de remonta da Polícia Militar da fazenda Santa Tereza, município de Esmeraldas.
A comemoração se dará no dia 1º de Maio que, a cada ano, é reservado à comemoração do Dia do Ex-aluno, reunindo diversos deles na Escola-Mãe. É sempre uma festa marcada pelo espírito de irmandade.
Em razão de se comemorar os 70 da Escola, o programa será muito especial constando de: apresentações da orquestra de Esmeraldas e culturais; missa festiva, momento solene com autoridades e cavalgada.
Um momento para reverenciar a memória do Coronel Almeida. Apresentação de alunos e ex-alunos, e shows artísticos por convidados.
De 14h às 15h  serão prestadas homenagens à FUCAM por seus 70 anos- Homenagem  emomento para celebrar pessoas que fizeram e fazem parte da história da Fundação Educacional Caio Martins.
A partir das 15h – Shows, apresentação do terno de foliões de Padre João (comunidade vizinha).
Mais atrações: Atividades Culturais e Esportivas: Feira de Artesanato,Praça de Alimentação,  Feira com produtos orgânicos/artesanais com delícias do Norte de Minas;  Rua de lazer para as crianças; Tendas de serviços;  Rua da Memória;  Pau de Fita; Dança; Oficinas do Pólo de Educação Integral,  Esportes,  Jogos.

sexta-feira, 20 de abril de 2018

CAIO MARTINS, RETRATO DE UM BRASIL DE HOJE

XXXVI – Parte
OS EDUCADORES – III
Foto na frente da República, em 1953.
Da esquerda para direita, na primeira fila: Jurandir Luchesi, R
aimundo e Saldanha. Na segunda fila: Zé Maria Pinto, Márcio,
Fabiano, Marcos, Pedro Buchene e Antônio Moró. No alpender: Jonas e João Naves.
Tantos foram os educadores que tivemos na Escola Caio Martins de Esmeraldas, homens e mulheres tão simples que, em seu mister, ainda que como meros servidores, se fizeram educadores pelo exemplo, pelo carinho e atenção dispensados aos alunos, em especial aos pequenos.
RAIMUNDA CASSIMIRO LIMA – como não lembrar daquela figura de físico tão frágil, mas de indômita força de trabalho,  muita personalidade e forte caráter. Começou como cozinheira da primeira República do Curso Normal Regional, com um grupo de 11 alunos (foto). Depois no Artesanato, com um grupo bem maior de alunos. Como cuidava de mudar o cardápio a cada dia, mesmo com as dificuldades da Escola, no que contava sempre com o apoio de dona Maria Célia que morava ao lado da República, tomando conta da moçada, e depois no Artesanato.  Dona Raimunda nos tratava como tratava seus filhos Virgínia (nossa colega de turma) e Márcio. Como posso esquecer a recomendação que ela fez a Vilma, quando nos casamos: “não deixe João Naves comer muita mandioca, pois ela lhe faz mal”. É que de uma certa feita, depois do exagero do consumo de mandioca frita (tão gostosa como ela sabia fazer) eu, deveras passei mal.
SEU VOLTAIRE. Para nós era o “sô Volté” que cuidava das parreiras de uva nas proximidades do artesanato e dos gansos que passeavam nas redondezas das lagoas, sempre tão barulhentos. Ele tinha uma maneira muito especial de se vestir: bermudão com o cós acima do umbigo – tornava-o uma figura caricata, mas muita simpática e amável. Como demos trabalho para ele atacando as uvas, mas ele via tudo com compreensão e bondade, ensinando e nunca condenando
SARGENTO LARA. Trabalhava no escritório. Por uns tempos foi chefe de um dos lares. Era um figura muito simpática, muito educado, que nos tratava muito bem. Não me lembro bem qual era o seu parentesco com Clarinha – filha ou irmã. Sei apenas que ela era o encanto aos nossos olhos: loura de olhos verdes como o Sargento Lara. O encanto só diminui quando ela começou um namoro com o professor (agricultura) Nícias, exímio violonista e cantor, que conquistou Clarinha com belas serenatas. – ele era de Patrocínio. Eu conhecia a família dele.
Banda de Música Furiosa
MAESTRO JUVENTINO. O coronel Almeida o garimpou no Corpo de Bombeiros, conhecidos que eram das barrancas do São Francisco. Seu Jovem, como era conhecido, foi maestro da banda de música de São Francisco, onde o coronel Almeida viveu quando adolescente. Seu Jovem formou a primeira banda de música da Escola, a nossa Furiosa. Ninguém acreditava, ora, partir do zero com uma meninada que sequer conhecia um instrumento musical. Em pouco tempo a banda já se exibia. Mais do que isso: formou músicos que, mais tarde, se ingressaram na banda do Corpo de Bombeiros e fizeram carreira militar. Entre eles Gilson e Nilson, filhos do seu Jove. E outros tantos, como Nelson (excelente violonista), Durval (se fez médico e pianista), entre outros. Eu, Raimundo e Saldanha, que éramos da banda de música do Instituto João Pinheiro, muito mais adiantados que os alunos recrutados pelo seu Jove, negligenciamos quanto aos ensaios. Quando acordamos, os novos músicos haviam nos deixado para trás. Constrangidos perdemos a oportunidade de participar da primeira banda de música da escola. 
Casa de seu Chico e dona Targina
João Naves de Melo

VOZES DOS CIDADÃOS



João Naves de Melo
JOSÉ AGUIAR, IEIÉ – VI
Primeiro fato: Ieié casou-se com Cecília Antunes, primeiro eclesiasticamente, em Brasília, indo morar no Jacu. Passados alguns anos resolveram casar-se no civil. Teriam que se deslocar até Brasília, sede do município, considerando que não havia cartório na Vila. Isso, naquele tempo era muito difícil. Ora, ali do outro lado do Guariba já era São Francisco e na Vila do Morro tinha o bendito Cartório, era mais perto. Acontece que Ieié, amigo do escrivão, conseguiu uma deferência toda especial: que ele se deslocasse até à divisa dos dois municípios e, assim, ele e dona Cecília casaram-se no município de São Francisco, na beira do Córrego, a pouco mais de 1 km do Jacu.
Ieié começou a vida como tropeiro, conta Zé Aguiar. Ele tinha duas tropas. Transportava mercadorias desta região para Curvelo – levava toucinho e sal (que vinha do Nordeste através do rio São Francisco) e de lá trazia tecidos, arame farpado, café, querosene e outras mercadorias. Trazia, também, as famosas selas curvelanas que só os ricos usavam. Entrava ano e saía ano e as viagens não paravam. Ieié, montado num burro, acompanhava todas as viagens..
Uma curiosidade: nessa época o Zezé Botelho e o sr. Dodô (pai adotivo de Ernestina Botelho) tinham, também, duas tropas, viajando todas juntas com as tropas de Ieié. Era um belo espetáculo, um “barulho enorme”, quando chegam numa localidade com os guizos nos peitorais das mulas madrinhas das tropas zoando que nem música.
“Toda tropa tinha uma madrinha – era a mula de frente, toda enfeitada com tiras de pelego e um peitoral cheio de guizos de diversos tamanhos que produziam sons diferentes e formavam um concerto musical maravilhoso. A posição da madrinha da tropa era respeitada por todos os burros e nenhum tropeiro se atrevia passar na frente…”, lembra Zé Aguiar, com saudade.
Ieié, de tropeiro passou a ser dono de caminhão, sendo um dos primeiros proprietários desse tipo de veículo na região. Na atividade, no entanto, ele assomou um grande fracasso. A viagem, para ir e vir, a Montes Claros, leva até dois meses. Quando o caminhão quebrava era um Deus nos acuda, pois as peças eram despachadas de São Paulo.
Outra atividade do Ieié foi a de boiadeiro – por muitos anos ele comprava bois aqui na região e os vendia em Montes Claros e até mesmo noutras cidades mais distantes.  Comprou boiada de Tarcísio Generoso, Oscar Caetano Gomes e Antônio Ramalho, na fazenda Barreirinho. Desse tempo, Zé Aguiar sabe um punhado de histórias pitorescas, envolvendo marruás e bichos que certamente ainda virão a lume.
Zé Aguiar, nos seus 12 anos de idade, acompanhou uma jornada em que seu pai conduzia mais de 280 bois, que vendeu para o capitão Enéas Mineiro de Souza. A viagem, da fazenda Poções a Montes Claros levou 7 dias. E diz Zé Aguiar: “o meu cavalinho tinha o nome de Petisco. Ele era muito bom e bonito. Selinha nova, chapéu de couro, com barbela, bota e esporas. Tudo para mim era, enfim, uma maravilha”.
Na jornada tinha os pontos certos de pouso, em fazendas que eram próprias para receber boiadas, os pastos cercados,e os boiadeiros em ranchões – os donos do gado às vezes eram convidados para pernoitar na sede da fazenda, com o proprietário.
De 12 a 15 vaqueiros conduziam o gado. Na frente os guias, tocando o berrante. Casualmente, sem ninguém perceber, ficava um boi para trás, mas, no caso, bastava tocar o berrante que ele vinha de carreira se ajuntar ao rebanho. No caso de boi arribado mais renitente, às vezes, era preciso ser recuperado pelos peões.
Na frente, bem antes, da boiada, ia o cozinheiro com sua tralha, ele tinha que chegar antes no ponto para preparar a comida dos tropeiros. O almoço era de manhã, geralmente a feijoada que era preparada à noite.
Essa é a história de Zé Aguiar, o filho – boiadeiro, comerciante e, por fim fotógrafo que levou ao inesquecível presidente Juscelino uma foto da avenida que tinha, em São Francisco o seu nome, dele e, por isso, recebendo um agradecimento especial e ficou sabendo, ainda, que ele conhecia São Francisco e sua gente.
Um pouco também, de passagem, da vida de José Aguiar, o pai, ou Ieié, que também faz parte da história de São Francisco, pelo trabalho e família que aqui constituiu.

sábado, 7 de abril de 2018

VOZES DOS CIDADÃOS

João Naves de Melo
JOSÉ AGUIAR JÚNIOR – IV
A saúde de Zé Aguiar se complicou, o diagnóstico médico chegou à conclusão que era por causa da poeira. Por isso, ele vendeu o comércio e tudo que tinha no povoado e se mudou para São Francisco.  Mexe daqui e dali até que fez um curso de fotógrafo. Sem nenhuma prática abriu o seu pequeno estúdio e recebeu os primeiros clientes. Na época São Francisco recebia uma banca examinadora de motorista. Os candidatos precisavam de fotografias e o seu estúdio foi, então, a salvação. O primeiro cliente que apareceu foi o dr. Oscar. Zé não pensou duas vezes, clicou a autoridade. Vieram outros e mais outros. Clicar era a parte mais fácil, mas na hora de revelar era uma coisa horrorosa, Zé Aguiar viu como era distante a teoria da prática. Revelou a foto do dr. Oscar uma, duas, três e tantas vezes e nada. Saia a silhueta dele, um tição. Os óculos refletiam como a luz do olho de gato no escuro. Zé entrou em pânico. Chegava a hora de entregar a foto. Chegou dr. Oscar e Zé teve que revelar o desastre. Foi franco obastante e devolveu o dinheiro. Dr. Oscar não aceitou e, para completar levou, assim mesmo o esboço de fotografia. O mesmo aconteceu com os outros clientes, pois precisavam das fotografias, de qualquer jeito.
Assim ele começou a sua carreira de fotógrafo profissional. Com o tempo foi se aperfeiçoando, adquirindo novas máquinas e laboratórios. A primeira máquina foi de marca Start – B, polonesa, uma reflex. que tem guardado até hoje. Depois vieram outras mais conhecidas e famosas. Tem um arquivo com uma verdadeira coleção: Rolleflex, Pratika e outras modernas.
Assim, José Aguiar Júnior inaugurou nova vida e se constituiu no primeiro fotógrafo profissional de São Francisco, mantendo um estúdio até hoje. Antes, porém, deu uma parada. Num período de mais ou menos três anos atendeu aos instintos de boiadeiro, e voltou a lidar com o gado, a fazenda. Depois, deu outro salto, montou um comércio de material de construção e, por fim, rendeu-se ao chamamento do fotógrafo, sossegou-se em seu estúdio na avenida Presidente Juscelino. Graças à persistência, o ofício de fotógrafo, num belo dia, o colocou frente a frente ao grande presidente que deu nome à avenida.
Assim foi que Zé Aguiar pode, na década de 60, ter clicado a miss, num carro alegórico, desfilando pela bonita e recém inaugurada avenida Presidente Juscelino e, depois, num momento de inspiração ter oferecido a foto ao ex-presidente, recebendo dele, uma carta de agradecimento.
Fica, dessarte feito o registro de um fato curioso e importante na história de São Francisco – a referência do contato com o inesquecível presidente Juscelino e, depois, como complemento, não menos importante, detalhes do surgimento do povoado de Jibóia, hoje importante Vila Santana de São Francisco, uma área totalmente urbanizada e, por fim, como surgiu o fotógrafo, o primeiro fotógrafo profissional de São Francisco.
Zé Aguiar casou-se em 1968 com Maria Senhora Mendes Aguiar com quem teve as filhas Márcia, casada com SadyMaynart, (deles tendo os netos Sady, Marcel e Paloma), Renato e Marília.
Entrevista publicada no jornal O Barranqueiro no ano de 2004.

PEQUENA CRÔNICA

PATINHO FEIO

Os prédios da Prefeitura, Câmara Municipal, Secretaria Municipal de Obras, Transportes e Urbanismo e Escola Técnica Cel. José Ortiga receberam roupagem nova, neste começo de ano. Os prédios das Secretarias de Cultura e Turismo, e Educação, também passaram por ampla melhoria externa. As secretarias de Desenvolvimento Social e Saúde, funcionam em prédios adequados, confortáveis.
A Secretaria Municipal de Agricultura e Meio Ambiente está instalada no centenário prédio localizado no começo da avenida Montes Claros, frente para a rua Direita e lado para a Praça da Matriz. Um ponto histórico a considerar que o prédio foi construído por Francelina Alexandrina de Azevedo, que a vendeu para o padre Nicolau Ciampoli, que a reformou e ampliou em 1918 e vendeu  Rajo Fortes, que nele foi  instalado o primeiro hotel de São Francisco. Depois, no correr dos anos, recebeu os seguintes órgãos: Fórum, Prefeitura, Câmara Municipal, escritório da Emater, posto da Junta Militar e, agora Secretaria da Agricultura e Meio Ambiente. É, sem vida, excluindo-se o valor histórico,  o mais feio e triste de todas as outras instalações, um “patinho feio”.
Aí vem a boa notícia – dada nesta edição: o prefeito Evanilso autorizou ao secretário Cosmo, da Agricultura, a proceder reformas nas instalações do Parque de Exposição Zezé Botelho com o fim de instalar a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente e outros departamentos municipais.
Mais que do que isso, pretende o secretário: montar estandes permanentes voltados para agricultores familiares e outros, com indicação de projetos que podem – e devem – ser implantados em propriedades rurais no sentido de gerar renda, incentivar a produção com vistas ao PNAE.
No caso é de se lembrar o conto de fadas de Christian Anderson, O Patinho Feio que era, na verdade, um cisne.

CAIO MARTINS, RETRATO DE UM BRASIL DE HOJE

XXXIV – Parte
OS EDUCADORES
Sargento Xisto, sargento Barroso, sargento Enedino, sargento Izaías, sargento Navarro, sargento Chico, sargento Geraldo Ribeiro, sargento Penido, professor Alcides, Zé Fininho e dona Mundica, Geraldo e Geralda, seu Geraldo, Zé Nazário,  Catulino.
Um rol de educadores. A maior parte constituída por pessoas simples, humildes, mas que se revelaram por força de seu caráter e ministério empírico, verdadeiros educadores. Não tinham cátedra, mas possuíam o espírito missionário; não apontavam caminhos, mas os abriam com seu exemplo e trabalho honesto, sério, comprometido e, sobretudo, revelando grande amor à escola.
Parte deles remanescentes do Campo de Remonta que a Polícia Militar mantinha na fazenda Santa Tereza para criação de cavalos para sua cavalaria; outros cedidos quando da criação da escola em 1948. Mas da função militar restou apenas a lembrança, se fizeram novos educadores, cada qual em sua função servindo como espelho para nós – crianças e adolescentes – em nossa formação.
Não há como lembrar de detalhes ligados a cada um, pois o tempo encarregou-se de levar parte de nossas lembranças, que meninos éramos. Contudo, vou pinçar algumas lembranças, vincadas na memória de um menino.
Seu Xisto. Ele morava com sua família numa casa na beira da estrada que levava à pedreira, onde ele comandava os trabalhos. Ficava ela encrustada na borda de fechada e verdejante mata (o que era muito comum na Fazenda Santa Tereza), com uma fachada muito bonita voltada para uma baixada onde funcionários da escola cultivavam milho, feijão e mandioca para sua subsistência. Ali trabalhei muitas vezes na capina de quadras para ganhar um pouco de dinheiro para despesas imediatas, daquilo que a escola não fornecia.
Seu Geraldo. Sua casinha ficava próxima ao curral, no alto da Escola, era sua praça de trabalho: cuidar do gado, o que fazia sempre muito alegre e cuidadoso. Anos mais tarde, com a criação do curso técnico em Agropecuária, ele foi de grande valia no acompanhamento prático dos estudantes, que tinham o conhecimento teórico, mas não sabia, ainda, o fazer. O lema, então, da Escola era “Aprender fazendo”.
Seu Catulino. Era o barbeiro da escola. Agradável, folclórico, sempre disposto e demorados papos. Cortar cabelo com ele era por demais divertido, curtindo suas história que lembravam o Barão de Munchausen – nunca se sabia se era verdade ou coisa inventada. Então, era cortar o cabelo e levar para os colegas as novas histórias. Quanto aos estilo de corte: ele conhecia diversos – meia cabeleira, Príncipe Danilo e outros. O cliente escolhia o corte e ele executava com perfeição – qualquer que fosse o estilo pedido, o corte era um só. O que marcava a personalidade dele era o modo afável e atencioso que tratava os alunos clientes, muitas vezes dando lições de vida.
Sargento Chico. Já falamos sobre ele, num capítulo especial. Ele e sua esposa, dona Targina recebiam os alunos em sua casa como filhos, cobrindo-os de carinho, atenção e muito amor. Figuras indeléveis.
(CONTINUA)
João Naves de Melo

O JULGAMENTO

O julgamento colegiado oferece, à análise, nuanças mais diversas, que para os leigos são incompreensíveis. É um tal fraseado para no final chegar-se ao óbvio ao que se pretende votar deixando transparecer enganação. Alguns casos no julgamento do Habeas Corpus impetrado pelo advogados do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal – pode ou não pode prender o cidadão depois de sentença prolatada em 2ª instância?
A primeira questão que deixa o leigo em dúvida é: já não existia entendimento firmado no próprio STF a respeito dessa questão, ou seja, definindo que réu condenado em segunda instância, deveria ser preso? Então por que voltar a mesma questão apenas para um caso específico. Pairou, no ar, um quê de enganação, mascarada com o palavrório.
Um ministro, sempre tido como dos mais respeitados, começa seu voto condenando a corrupção praticada por políticos, governantes e empresários, um mal terrível que prejudica o País. Sinalizou-se que corrupto deve ser preso. Mas votou a favor do HC-Lula.
Outro falou sobre a presunção de inocência e que nenhum condenado pode ser preso antes de esgotar todos os meios de defesa, inclusive na 3ª instância. Aí ficou no ar um questionamento: qual seria o destino dos condenados e presos pela operação Lava Jato – uns até 100 anos de prisão? Deveriam ser postos na rua, passear por aí até que em 10 ou 20 anos tenha um deslinde o seu processo?
Vem outro e completa suscitando a situação dos presídios brasileiros, totalmente lotados e de má qualidade, arguindo, ainda, que no Tribunal existem milhares de processos aguardando julgamento. Não seria, nesse caso, negar o HC já antevendo que se concedido o réu não seria julgado antes da prescrição da pena? Mesmo assim votou a favor da concessão do HC.
Vencida a pretensão do ex-presidente, foi decretada a sua prisão, determinada pelo TRF4 ao juiz Moro.  Pronto! Mais uma novela com capítulos espetaculares, suis generis. Ora, o ex-presidente foi condenado por um juiz de 1º grau. Condenação confirmada e aumentada por três desembargadores de 2º grau e, depois, por 5 ministros de 3º grau, portanto com o placar de 9×0, nenhum voto a se favor. E vem o argumento que a condenação do ex-presidente foi uma manobra política, que feria a democracia. Não houve tal grita quanto à prisão de Sérgio Cabral, Eduardo Cunha e Marcelo da Odebretch e outros empresários. Uma banda da corrupção já se encontra atrás das grandes. Seria ela uma sombra a pairar sobre o palácio do STF se concedido o HC Lula? O tempo dirá, a história cobrará.
Em tempo:  Impeachment da presidente Park Geun-hye: vitória da democracia na Coreia do Sul. Na quinta-feira 30/3 ela foi detida  após tribunal de Seul ordenar sua prisão preventiva imediata.
No Brasil impeachment e condenação, mesmo com ato jurídico perfeito, são tidos como conotações política e contra a democracia.