sábado, 27 de abril de 2024

NOSSA CIDADE: FATOS HISTÓRICOS

 Nota: Esta monografia será dividida em capítulos, 

mais curtos, para uma melhor leitura.


Igrejinha e cruzeirinho de Teodoro



EM BUSCA DAS ORIGENS – XVI

  

       À memória do notável Domingos Diniz o barranqueiro mais amante que amante do Rio São Francisco e a sua gente, e das veredas”

 

ERA DOS VAPORES

 

O vapor apitou – a cidade estremeceu na alegria de sua chegada;

O vapor apitou – a cidade chorou na saudade de sua despedida – JNM

 

A história de São Francisco está intimamente ligada ao Rio São Francisco – vital e sentimentalmente. O escritor são-franciscano Geraldo Ribas cunhou uma frase lapidar que expressa esta íntima ligação: “O são-franciscano tem o umbigo ligado no Rio São Francisco”.  De fato, revendo fatos relacionados a diversas famílias são-franciscanas, veremos histórias ligadas ao rio e, em caso especial, aos vapores. Muitas famílias aqui plantaram raízes migrando de distantes plagas nordestinas, aportaram com certeza definida ou por obra do acaso como aconteceu, especialmente, com João Próbio e seus versos pictóricos sobre sua vinda para São Francisco.

São Francisco não teve referência especial na história das barcas em vista de não ter se destacado em valor econômico como São Romão e Salgado (Januária), interessantes e movimentados portos com intensa movimentação de importação e exportação de diversos produtos. Salgado exportava  rapadura, cachaça e couro e importava, entre outros produtos, o sal que era comercializado com Goiás. São Romão abria a porta para Paracatu pelo rio do mesmo nome, com embarcações levando sal e arame e outros produtos que provinham do Nordeste e de lá transportando carne e couro. Com os vapores, no entanto,  São Francisco tornou-se ponto registrado no mapa da navegação. Regularmente aportavam vapores na cidade, o que era sempre motivo, além da atividade  comercial, para integração social e muita festa. São muitos os registros que veiculam os  vapores à história de São Francisco.

Lembro-me bem do vapor no porto da cidade. Dia ou noite; sol ou chuva, lá estava o agente seu Massu (Maximino Magalhães) na azáfama atividade do cargo. No cais, uma multidão deslumbrada ou atenta à comercialização. Meninos, mulheres e homens, com suas mercadorias, muitas dos agrados de viajantes e tripulantes: doce de buriti, queijos, requeijões, tapioca, umbus, pequis, artesanato – de barro e pano. Do vapor a oferta de redes, de pedras para forno de farinha, pedras filtro de água.

A viagem a bordo deles era fator de sociabilidade – só quem foi embarcado pode expressar a emoção vivida. Eu, por minha vez, numa viagem pelo Antônio Nascimento, de Pirapora a São Francisco, vi-me em profícuo interlóquio com um jovem francês (também eu muito moço à época). Por horas ele me falava sobre a França e tudo queria saber de mim sobre o Brasil.

Domingos Diniz, Ivan Passos Bandeira da Mota e Ângela Diniz,  no belíssimo livro Rio São Francisco – Vapores & Vapozeiros, trazem a lume a história dos vapores na navegação do São Francisco – 45 deles singraram as águas do rio durante décadas até que os transportes rodoviário e ferroviário avançaram e, o mais triste, o rio São Francisco tornou-se impossível à navegação totalmente assoreado.

sábado, 20 de abril de 2024

NOSSA CIDADE: FATOS HISTÓRICOS

 Nota: Esta monografia será dividida em capítulos, 

mais curtos, para uma melhor leitura.


Igrejinha e cruzeirinho de Teodoro



EM BUSCA DAS ORIGENS – XVI

  

        O  CAMINHO PELO RIO


Inaugura-se uma nova era – povoamento das barrancas e a navegação pelo rio São Francisco, que se tornou a via comercial das Minas com a Bahia. Canoas a princípio, depois as barcaças, intensificando a navegação ligando Pirapora a Juazeiro, abrindo uma linha interligando o  Sul e o Norte dando ao rio um papel importante na integração do Brasil, lembrando Geraldo Rocha quando afirmou que o “O Rio São Francisco, fator precípuo da existência do Brasil”. As barcaças, em princípio, tiveram um papel importante como meio de transporte de mercadorias  dando proeminência a São Romão e Januária que tiveram movimentados portos.

Chegando-se ao século XVIII observa-se  importantes mudanças sociais e econômica na região do Médio São Francisco. Zanoni Neves anota o que “Sob o impulso do desenvolvimento comercial, alguns povoados foram fundados ao longo da ribeira. Outros como  Barra do Rio das Velhas, São Romão, Salgado e Matias Cardoso cresceram sob o influxo das articulações regionais e inter-regionais”. Surgem, então, as barcas que tinham como principais atividades o transporte de cargas e o comércio ambulante no curso de Juazeiro a Pirapora. As barcas eram importantes na vida econômica dos habitantes das cidades e vilas. Os donos de vendas, ou seja, os pequenos comerciantes de secos e molhados, eram clientes das barcas, onde compravam a rapadura, o sal, a farinha, o feijão, o arroz, a carne seca, o açúcar, a cachaça, o querosene. E mais, havia barca onde se podia comprar tecidos, adornos para as residências, produtos de ourivesaria, carretéis e novelos e calçados.

A par do fator econômico registra-se que os remeiros legaram ao folclore um acervo significativo, sobretudo no campo da literatura oral, como registrado por Zanoni:  poesia, música, casos, contos, mitos e lendas, anedotas e outras narrativas, como o milagre de Bom Jesus da Lapa foram difundidos em toda a região são-franciscana pelos navegantes das barcas”.

No estudo sobre o papel das barcas na história do Médio São Francisco, quanto a fator socializante, econômico e cultural, recomendo a leitura dos livros Os Remeiros do Rio São Francisco, do mestre Zanoni Neves e São Francisco – o rio da unidade  nacional, editado pela Mercedes-Benz do Brasil S.A. É uma oportunidade interessante para conhecer como era extremamente penoso o trabalho dos remeiros na condução das barcas em viagens que poderiam se prolongar por mais de 4 meses; a interação social deles com as mulheres barranqueiras nos prostíbulos, a sua valentia e a maneira como eram tratados – discriminadamente  – pela sociedade das cidades onde aportavam as barcas. E mais, vale a pena – e muito – ver o belo trabalho fotográfico do  francês Marcel Gautherot – Retratos da Bahia, com texto de Lélia Coelho. Trata-se de uma verdadeira obra de arte.

Os vapores terão o registro do nosso sentimento no próximo capítulo.

sábado, 13 de abril de 2024

NOSSA CIDADE: FATOS HISTÓRICOS

  Nota: Esta monografia será dividida em capítulos, 

mais curtos, para uma melhor leitura.


Igrejinha e cruzeirinho de Teodoro



EM BUSCA DAS ORIGENS – XV

  

        Ponto de partida para São Francisco. Segundo Gilberto Freire (Casa Grande & Senzala) “No Brasil, as relações entre negros e as raças de cor foram desde a primeira metade do século XVI condicionadas, de um lado  pela sistema de produção econômica – a monocultura fundiária: do outro lado a escassez de mulheres brancas, entre os conquistadores”. Daí, deu-se início à formação da etnia brasileira, no que escreveu  João Ribeiro: “a fusão das raças branca, negra e vermelha traduz-se em vários tipos de cruzamento (mameluco, mulato, cafuso) branco-índio, branco-negro, índio-negro”.

Neste contexto, a região do Médio São Francisco, compreendendo  uma faixa de São Romão  a Matias Cardoso entra na história a partir da segunda década do século XVIII quando Januário Cardoso foi nomeando pelo Governo-geral com poderes absolutos de Regente, com ordem a pacificar o rio, ainda que a peso de  armas, Ele então ocupara o lugar de seu pai o capitão-mor Matias Cardoso fundador do povoado Morrinhos, hoje Matias Cardoso.

O desenvolvimento populacional desta região foi gradativo, de acordo com circunstâncias de fatores ligados à expansão da pecuária, da criação de fazendas às margens do Rio São Francisco. Januário Cardoso,  tomando um exemplo sugerido pelos índios, que tinham  suas tabas independentes e ligadas apenas ao poder  do cacique, foi entregando a seus companheiros de armas, parentes e amigos íntimos, o governo e domínio das aldeias e novos arraias. Assim foram criadas as fazendas Pedras de Cima (São Francisco), de Domingos do Prado e Oliveira, e Pedras de Baixo (Maria da Cruz) de Pedro Cardoso.

Pelo mesmo motivo que levaram Januário Cardoso a entrar para o S. Francisco, entrou pelo rio Pardo o Capitão Antônio Gonçalves Figueira,  companheiro de armas de Matias Cardoso, que para completar o plano de pacificação, ocupou imediatamente os territórios do Rio Verde e Gorutuba em correspondência com os arraiais do S. Francisco fundando por seu lado Itaí, Olhos-d´Água e Montes Claros.

Assentadas as fazendas Januário Cardoso deu curso ao plano de pacificação enviando tropas comandadas por seu sobrinho Capitão Manuel Tarcísio Toledo, guiado por Manuel Pires Maciel com o concurso de Domingos do Prado, para combater os índios sediados na ilha Guaíbas e na aldeia Tapiraçaba,  no que resultou na criação de São Romão e Januária.

Faço um registro paragonando os desenvolvimentos, através dos anos,  de São Francisco, São Romão e Januária, cidades ribeirinhas, com Montes Claros surgida pela entrada do sertão. Registro feito por Diogo de Vasconcelos (História Média de Minas Gerais) “Quando se avolumou a população das Gerai, e o comércio cresceu de valor em gêneros alimentícios, em gado principalmente, o Capitão que já tinha aberto caminho ligando Montes Claros a Tranqueira, encruzilhada que vinha da Bahia para o S. Francisco, prolongou a linha de Montes Claros  ao Rio das Velhas, encontrando com esta o itinerário , que ia do Sabará à mesma cidade. A viagem tornou-se, além de tudo, mais cômoda e por zonas saudáveis, preferida, portanto, pelos viajantes que deixaram de passar pelo Rio São Francisco”.