João Naves de Melo - Membro da Comissão Mineira de Folclore
Sexta parte
O LUNDU
O lundu é uma dança extremamente sensual com muita volúpia, engodos, leveza e trejeitos. Ela é origem africana, trazida pelos escravos bantos. Ganhou os salões da nobreza e depois foi se descaracterizando, dando lugar a outras danças locais, perdendo o nome como registra Câmara Cascudo: “Vive como uma modalidade faceciosa de canção, porque a coreografia evoluiu para o samba, solto, individual, sacudido, enfim a batucada, onde cada bailarino é um competidor da execução anterior”. São Francisco guarda os princípios da evolução: homens e mulheres forma uma grande roda, cercando os tocadores assentados em bancos. Batendo palmas acompanham os puxadores das modas e, no final de cada canto, um homem se desloca para o centro da roda vai sapateando, batendo palmas e rodopiando até chegar defronte a uma mulher escolhida, que chama, batendo palmas bem perto do seu rosto. Ela entra na dança com toda leveza, rodopiando, com as mãos prendendo a saia, sapateando graciosamente, sem muito vigor. O dançador se desdobra em graças, fazendo-lhe volteios, sapateando, trocando passos no ar e no chão, com muitas negaças e volúpia juntar-se à ela, que o desdenha. O ritual vai se repetindo com outros pares, varando a noite com toda alegria.
Com o tempo surgiram algumas novidades, reflexo da criatividade dos dançarinos. Adão Barbeiro criou as danças do facão e da garrafa. A primeira uma modalidade exige muita destreza e cuidado, pois o ritmo que tradicionalmente era marcado com as palmas, se faz com o brandir de dois facões, sobre a cabeça e entre as pernas enquanto os pés, no mesmo ritmo fazem as evoluções da dança, com o sapateado. A da garrafa, mais simples, só exige equilíbrio, pois toda a evolução da dança, com os sapateados e palmas, é feita com uma garrafa de água na cabeça.
Muito apreciada no lundu é a harmonia do instrumental, que flui com naturalidade de uma orquestra ensaiada e afinada. A melodia guarda tantas recordações telúricas recordações como sopro da alma. As caixas são afinadas com a corda lá do violão. São tocadas com suavidade tal, que mal se percebe o seu gemido dando sustentação às violas, rabecas e violões. Os violões fazem a marcação do ritmo e as violas serpenteiam no floreado frenético de dedos ágeis e no fundo, os gemidos fechando os acordes, como um lamento, a rabeca. Entra-se em horas a fio, com os cantos e sapateados, as palmas fortes bem marcadas e uma alegria singela, pura, de quem vive a vida na sua forma mais natural e simples, sem pressa, sem preocupações, sem o dia do amanhã, só em estado de graça.
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