O primeiro seminário do meio ambiente realizado em São Francisco em 1988 despertou a atenção da comunidade para importância e necessidade de recuperação e preservação da bacia do Rio São Francisco. Daí, surgiu o Projeto João Botelho Neto que se redefiniu no Codema empreendendo, em segmento imediato, ações práticas e efetivas no estudo da situação ambiental no município. Deflagrou-se um processo de cercamento de nascentes, construção de terraços e de barraginhas com visível sucesso do trabalho comum do poder público e sociedade. Foram realizados dezesseis seminários do meio ambiente debatendo os problemas que afetavam a bacia do rio e buscando alternativas para preservar cursos d´água com a implantação do projeto “Plantando água”. Uma preocupação na realização dos seminários era a de atingir o meio estudantil e produtores rurais. Por outro lado, equipes do Codema entregaram-se a pesquisar os efeitos da devastação do cerrado no município chegando-se a conclusões assustadoras: a voracidade na produção de carvão causou danos irreparáveis em diversos sítios com o plantio de quadras e mais quadras de eucaliptos alterando, radicalmente, o bioma com graves prejuízos para a flora e a fauna. Em alguns casos, com o apoio do Ministério Público, foram alcançadas compensações que possibilitaram a constituição de uma patrulha ambiental mecanizada posta a serviço dos proprietários rurais na abertura de tanques e barraginhas e construção de terraços.
Outro fato importante foi a implantação do Comitê de Bacia Hidrográfica SF9 – Afluentes Mineiros do Médio São Francisco congregando 24 município do Norte de Minas com sede em São Francisco. Foi um meio de expandir a política operacional de recuperação da bacia do Rio São Francisco.
Avanços e retrocessos, foi a norma. Soprou um vendaval e o processo que vislumbrava reter a degradação do São Francisco e manter o mínimo de vazão de água em seus afluentes, estancou-se e, em alguns casos retrocedeu-se com a extinção da patrulha mecanizada do meio ambiente pela administração municipal. Incrível, mas aconteceu.
O tempo escoou-se e o quadro foi se tornando cada vez mais tétrico. Na margem esquerda: rios Acari e Pardo estão degradados e com reduzida vazão. Riachos e córregos (Bom Jardim, Lajes, Veredas Prata, Caldeirão, Cedro, Cubango e D´Anta) totalmente degradados e secando em certos períodos do ano. As grandes lagoas Pinhãozeiro, Renascença, Bonita e Prata, degradadas e secando, algumas, no período da seca. Na margem direita: todos cursos são intermitentes (pluviais). Lagoas Grande, Luzia, Vaqueta todas degradadas e em processo de extinção.
São Francisco, no ano de 2024, encontra-se diante de um processo de regressão na questão ambiental. Todos os esforços dispendidos, até então, estão comprometidos.
No âmbito mineiro, quanto ao rio, a análise será feita outra ocasião.
RIO SÃO FRANCISCO HOJE – IV
Enganam-se aqueles que têm a situação do rio São Francisco como fator presente e atribuído a questões climáticas. Ocorre, como fato, incontestável, embora negligenciado, que a atual situação do nosso grande rio já se prenunciava há muitos anos, não só pela visão cotidiana de barranqueiros, mas por depoimentos de estudiosos do rio. Em 1983 a CODEVASF publicou o livro “O Rio São Francisco – fator precípuo da Existência do Brasil”, de autoria do engenheiro Geraldo Rocha. O autor destaca a importância do São Francisco como fator responsável pela unidade nacional, o que permitiu a formação da grande nação brasileira, ele faz severos alertas em referência aos problemas que afetam o grande rio: enchentes e secas empecilhos severos para o desenvolvimento regional. Vê-se, então, que a seca não é um fenômeno atual, assim como as baixas vazões do rio. Observou Rocha: “O São Francisco até agora entregue a seus caprichos, assola de quando em quando a região ribeirinha, afogando rebanhos ou matando-os à sede, quando inunda ou seca em demasia” E observa: “Regularizando o seu curso, transformando seus afluentes em reservatórios de compensação, ficará assegurada a sua navegabilidade perene, pondo em comunicação o vasto hinterland que vai da serra da Canastra a Paulo Afonso. Estamos diante de um duro dilema: ou dominamos o São Francisco ou o Brasil desaparecerá como grande Nação. Imaginemos, por um momento, que em um interregno de meio século o São Francisco se transforme e em uma torrente intermitente, semelhante ao Jaguaribe e que um extenso deserto separe o coração do Brasil de Minas Gerais até o mar. Infelizmente este prognóstico não é produto de uma imaginação exaltada, compulsem os estudiosos trabalhos de Halfed e Liais, e verão a forma alarmante e rápida por que o grande rio perde suas condições de navegabilidade”
Navegação há muito tempo já era. O que se anuncia, agora, é o da desertificação. Estudiosos apontaram a necessidade da construção de barragens com finalidade de reter as águas torrenciais e, com isso, a regularização do nível do rio possibilitando a navegação, irrigação e a vida barranqueira. No caso, houve um ensaio com a construção da barragem de Três Marias que não serviu ao propósito do projeto, entrega que foi à Cemig para geração de energia elétrica tão somente. Esperava-se que fossem construídas barragens nos rios Paracatu e o Urucuia, grande mananciais, também degradados pela voracidade do avanço do poder econômico consumindo o cerrado para a produção de carvão. A questão que teve avanço no final do século XVIII com a decadência da mineração, que levou à criação de fazendas estimulando a criação de gado e desenvolvimento da agricultura em áreas de nascentes, principalmente no Alto São Francisco. O avanço foi mais longe para alimentar as siderúrgicas de ferro dizimando o cerrado, “pai das águas”, anotado com razão por Ivo das Chagas, é só ater-se ao processo de captação das águas da chuva reabastecendo lençóis freáticos, que dão origem às veredas e, consequentemente, córregos e rios. Tudo está comprometido e o rio sofre. E nada é feito para salvá-lo.
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